Há algum tempo que me tenho vindo a cruzar com este filme. Há dois anos, mudança-traz-mudança, vivi um intenso período onde senti perder o controlo de tudo aquilo que julgava constituir a minha identidade e tive necessariamente que me repensar (quem acredita diz que foi o meu Retorno de Saturno). Foi nesse contexto que vi, pela primeira vez, o trailer não oficial - a cena de abertura do filme - de "A Minha Vida Sem Mim" (2003), filme espanhol e canadiano, realizado por Isabel Coixet. Aquelas palavras não podiam ter feito mais sentido e tornei-o uma das mascote da minha mutação sem nunca ter chegado a ver o filme.
"Esta eres tú. Los ojos cerrados, bajo la lluvia. Nunca imaginaste que harías algo así. Nunca te habías visto como... no sé cómo describirlo... como una de esas personas a las que les gusta la Luna, o que pasan horas contemplando el mar, o una puesta de Sol. Seguro que sabes de qué gente estoy hablando. O tal vez no. Da igual, a ti te gusta estar así. Desafiando el frío, sintiendo cómo el agua empapa tu camiseta y te moja la piel, y notar cómo la tierra se vuelve mullida bajo tus pies, y el olor, y el sonido de la lluvia al golpear las hojas... Todas esas cosas que dicen los libros que no has leído. Esta eres tú. ¿Quién lo iba a decir? Tú..."
Vi-o finalmente esta semana. As premissas prometiam: uma jovem confrontada com a sua morte anunciada revê a sua forma de estar no mundo. Depois desse trailer esperava uma história bem mais estruturada com momentos de maior reflexão sobre a condição humana e a omnipresença da morte na vida de alguém, mas o filme caiu na sua própria armadilha e todas as premissas prometedoras lançadas tornaram-se insuportavelmente desagregadas. Diante da sua morte, Ann (Sarah Polley) escreve uma pequena lista que sintetiza todos os sonhos e fantasias adiados por uma maternidade prematura. Foi aqui que senti que o que me foi "prometido" não tem qualquer intensidade e a narrativa cai num desfile de chavões adolescentes. Os desejos constantes na lista deixam de ser criveis face à leviandade e celeridade com que se realizam e pouco vemos da auto-reflexão que o trailer parecia querer sugerir.
À parte das minhas expectativas frustradas ficam os excelentes diálogos com o médico tímido (Julian Richings), a banda sonora e a fotografia de Jean-Claude Larrieu.
Depois do que significou, a cena inicial para mim será o filme. Vou fingir que "A Minha Vida Sem Mim" é uma curta metragem de 1 minuto e 40 segundos, em que uma rapariga de pés descalços se redescobre à chuva.
"Try your wings" de Blossom Dearie é um dos maravilhoso temas da banda sonora.
(Por entre várias incongruências há uma que não entendo definitivamente e que considero um erro colossal no filme: Ann e Don são canadianos e, pela sua história, percebemos que viajar para a Europa em 1994 seria impraticável. Como terá sido então possível os dois conhecerem-se no último concerto dos Nirvana quando este se realizou em Munique, na Alemanha? )
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