aurora




Aurora | "À Noite com Job, sob o Céu de Calar Alto" de Manuel António Pina
Aguarela e colagem | 10 x 15 cm
Maio 2011

Aquela pequena gata pardacenta que se assemelha a um grande rato conseguiu esconder-nos a sua gravidez por algum tempo. A veterinária olhou incrédula para a ecografia: "Ela é tão pequena! Parecem-me três crias, mas estas manchas poderão ser outras mais.". Faltavam já poucas semanas para o parto.
Foi no primeiro dia de Abril de 2010 que ela esperou por mim toda a tarde. Encontrei-a inquieta, soltando suaves gemidos. Preparei-lhe o ninho, telefonei ao Bruno e à Catarina e, ainda de gabardina vestida, assisti ao nascimento dos seus cinco filhotes.


*

Tinha este desenho por terminar há algum tempo lá por casa quando encontrei este poema de Manuel António Pina (outro apaixonado por gatos!), no Público de 13 de Maio. A Tica vive connosco há um ano e meio e, apesar da sua (aparente) estrutura frágil, a sua força surpreende-me, vezes sem conta.


"Alguma vez deste ordens à manhã, ou indicaste à aurora o seu lugar?”. Não me admiraria.


À Noite com Job, sob o Céu de Calar Alto

Como um Deus incompreensível
confundido pela própria
argumentação
perguntando: “Onde é que eu ia?”

Como uma pergunta
a que só é possível responder
com novas perguntas.

Como vozes ao longe discutindo:
“Alguma vez deste ordens à manhã,
ou indicaste à aurora o seu lugar?”

Como um filme
em que tudo acontecesse
na escuridão do espectador.

Como o clarão da noite última
e vazia que abraça pela cintura
a jovem luz do dia.

4 comentários: