fiando para desfiar

John William Waterhouse, Penelope and the Suitors, 1912

Recordas Penélope a quem a dedicação por Ulisses fez com que as suas mãos tecessem durante o dia a colcha para o dossel funerário do seu sogro, desfazendo-a durante a noite, longe dos olhares da corte. Fiando e desfiando esperava ganhar ao tempo a espera do seu marido.

Tecer é fazer teia ou tecido, é urdir, tramar, compor entrelaçando.

Criando um complexo entrelaçado também tu esperas ganhar ao tempo enquanto este apenas passa por ti. Passas pelo tempo. Confias-lhe que esbata, com o seu vagar, a lembrança daquele rosto esquálido de pupilas desconfiadas cravadas nas entristecidas órbitas. Confias-lhe a compreensão daquele temperamento receoso, defensivo, daquela forma leviana de existência.

Interrogas-te, quando já te sentias liberta, porque retomas à revolta quando encontras o vazio de tão pouco interessante olhar. Como o pudeste amar? perguntas ao tempo a quem tanto tempo não parece impressionar.

E tal como Penélope dedicas-te ilimitadamente ao teu trabalho, fiando e desfiando fio por fio, na espera da serenidade.

“Um dia, perceberás.”

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